O Dano Social na práticaVoltar

11/02/2015

Nova tendência nas ações judiciais com pedidos de indenização contra grandes empresas está surgindo no Brasil, sobretudo nos Juizados Especiais Cíveis. Além dos pedidos de indenização por danos materiais e morais, começam a surgir os pedidos de indenização por danos morais sociais. Alguns juízes reconhecem o instituto e, de forma perigosa, começam a julgar procedente parte dos pedidos, trazendo mais uma fonte de preocupação e de ônus para as empresas que já pagam a conta alta da “indústria do dano moral”.
 
 A possibilidade de reparação civil é elemento essencial para o equilíbrio em nossa sociedade, já que tem como objetivo recompor o patrimônio do lesado e coibir comportamentos danosos. No entanto, temos presenciado um exagero na responsabilização, com sentenças que reparam meros aborrecimentos e pequenos dissabores e não o verdadeiro dano moral, abalador psíquico e social. Deste fato decorre a preocupação da comunidade jurídica e dos empresários com o surgimento e consolidação das indenizações por Dano Social.
 
A tendência atual é a ampliação dos danos indenizáveis para que não somente os danos materiais e morais já previstos na legislação sejam reparáveis. Na sistemática atual, a responsabilidade civil por danos materiais, prevista nos artigos 402 a 404 do atual Código Civil que tratam das perdas e danos, prevêem aqueles que são legitimados a pleitear a correspondente indenização. Os dispositivos englobam os danos emergentes ou danos positivos, o que a pessoa efetivamente perdeu e também os lucros cessantes ou danos negativos, o que a pessoa razoavelmente deixou de lucrar. Os legitimados a pleitear indenização são aqueles que sofreram os danos diretos e imediatos do ato ilícito civil praticado por outrem. 
 
Os dispositivos supramencionados tratam dos danos materiais diretos, que atingem a própria pessoa, que, em conseqüência, pode pleitear a indenização cabível. No entanto, desde a Constituição Federal de 1988, surgiu a reparabilidade do dano moral como modalidade de dano imaterial. Com a Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça, do ano de 1992, reconheceu-se a possibilidade de duplo pedido de reparação, de danos materiais e morais, decorrentes do mesmo fato. O Código Civil de 2002, em seu art. 186, faz referência expressa à reparação do dano exclusivamente moral, que pode ser denominado dano moral puro, prejuízo imaterial que não guarda qualquer relação com a perda patrimonial. Assim, consagrado no ordenamento jurídico brasileiro o dano moral indenizável, sendo certo que o legitimado a perseguir sua reparação é a vítima, o próprio lesado.
 
Entretanto, a legislação prevê a reparação de danos materiais indiretos, ou seja, para pessoas que não sejam o próprio prejudicado. O dano acaba extrapolando os limites da pessoa lesada, fato que pode ser considerado o ponto de partida para a compreensão do dano social.
 
O dano social é fruto da tentativa de ampliação dos danos imateriais. Antonio Junqueira de Azevedo propõe essa nova modalidade. Para ele, “os danos sociais, por sua vez, são lesões à sociedade, no seu nível de vida, tanto por rebaixamento de seu patrimônio moral – principalmente a respeito da segurança – quanto por diminuição na qualidade de vida”.[1]
 
A idéia seria que, em teoria, quando o juiz percebe condutas socialmente reprováveis, fixa a verba compensatória à vítima e aquela de caráter punitiva a título de dano social. A indenização referente ao dano social não deveria ser direcionada à vítima, já que o dano não atingiu somente aquele autor específico e sim toda a sociedade. Desta feita, a indenização seria destinada a um fundo de proteção ao consumidor (art. 100 do CDC), ambiental ou trabalhista, por exemplo, ou até mesmo instituição de caridade, a critério do juiz (art. 883, parágrafo único do CC). Enfim, é a aplicação da função social da responsabilidade civil.
 
No entanto, no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis já começam a aparecer pedidos de indenização por dano moral cumulado com dano social, sendo certo que a indenização pretendida é sempre pedida ao autor da ação e nunca para um fundo consumerista. Ou seja, o dano social, mesmo que ainda timidamente, está sendo utilizado como mais uma verba de aproveitamento aos consumidores de forma individualizada, como verdadeiro instrumento de ampliação do proveito econômico nas demandas indenizatórias.
 
Entendemos ser importante à punição das empresas que adotam condutas lesivas de forma reiterada, no entanto, o enriquecimento sem causa de alguns consumidores, além de não ter o condão de servir como medida pedagógica, só acaba por onerar ainda mais os serviços para aqueles que não são parte das demandas, que é quem acaba pagando a conta.
 
Desta feita, apesar da inovação dos danos sociais e de seu caráter de reparação coletivo, cabe ao poder judiciário e aos órgãos de proteção ao consumidor maior rigor na aplicação das punições a todas as empresas de forma que referido instituto não seja banalizado como foi o dano moral e caia em total descrédito.
 
 

[1] AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Por uma nova categoria de dano na responsabilidade civil: o dano social. In: O Código Civil e sua interdisciplinaridade, cit., p. 376.