Reforma agrária no Brasil e a função social da propriedadeVoltar
11/02/2015
Pela concepção de Rosalinda Pinto da Costa Rodrigues Pereira: “A reforma agrária surge a partir da constatação de que o uso inadequado da terra entreva o desenvolvimento social e econômico do país, impedido o bem-estar da comunidade. Logo, toda reforma agrária parte da reestruturação da propriedade rural a fim de que a terra, mediante a exploração racional, obtenha uma maior produtividade, e assim possa proporcionar melhoria de condição de vida e bem-estar à sociedade como um todo.” (Rosalinda Pinto da Costa Rodrigues Pereira, Reforma Agrária – Um Estudo Jurídico, Belém: Edições Cejup, 1ª ed., 1993, p.29).
Com o advento da Constituição de 1988 nasce a concepção da propriedade privada muda de um direito de caráter absoluto, para um direito fundamental, ou seja, apesar de existir a propriedade privada está não é plena, pois passou a ser vista como instituição de ordem econômica, e por ser assim, fica restringida pela justiça social.
Ao colocar o direito de propriedade no rol de direitos fundamentais, significa dizer que não basta ser proprietário legítimo, é necessária a utilização da propriedade em atendimento à função social, só assim não será privado de seu domínio pelo Poder Público.
A função social da propriedade é tema rotineiro ao se falar sobre de reforma agrária, vista que, o não cumprimento deste que se torna elemento autorizador para a desapropriação.
Ao tratar do assunto, Nelson Ribeiro citado por Liberato, traz a seguinte noção: “Assim, a função social torna-se princípio ético jurídico voltado à ordenação da propriedade privada, incidente no próprio conteúdo do direito de propriedade, dando-lhe um novo conceito. A propriedade é, assim, reconhecida como uma função social, pela qual a sociedade prove e garante a subsistência dos seus membros. Atribuindo a propriedade a alguém, o Estado não pode fazê-lo em detrimento de outrem, sob pena de descaracterizar-se como instituição a serviço da sociedade.” (Nelson Ribeiro citado em Liberato, Reforma Agrária – Direito Humano Fundamental, p.58)
No que tange o assunto da função social, está já se enquadrava no artigo 2º, parágrafo 1º do Estatuto da Terra, todavia, o mesmo conceito foi abordado no artigo 186 da Carta Magna, em seus incisos I, II, III e IV, trata-se de rol taxativo, não podendo ser reduzido e nem aumentado por lei ordinária, ainda, ressalta-se que para a não satisfação da função social da propriedade basta o descumprimento de apenas um dos incisos elencados.
Percebe-se então, juntamente com a Lei nº 8.629/93, seu artigo 6º, nos parágrafos 1º ao 7º, que a função social da propriedade está amplamente ligada com a economia, vez que, considerar-se-á uso racional e adequado o aproveitamento de 100% de grau de utilização da terra e 80% de grau de eficiência na exploração, visto que, não basta que se obtenha a produtividade, mas sim, deve-se atentar na melhor utilização do solo, técnicas agrícolas, para a real utilização racional e adequada.
Ainda no assunto da função social da propriedade e a reforma agrária, aborda-se o questionamento se a reforma agrária ainda é considerada necessária ou não, vez que, muito se diz que com os grandes latifúndios as terras tornaram-se produtivas, dispensando assim, a necessidade de reforma agrária. Todavia, nos ensinamentos de professor Ariovaldo Umbelino de Oliveira (artigo As terras improdutivas no Brasil e a reforma agrária. Radioagênia NP, 18 mai. 2007), apresenta dados alarmantes sobre a grilagem, as terras devolutas no país e as propriedades improdutivas.
Destacando que, diferente do que a maioria pensa, essas terras devolutas não se encontram apenas na região Amazônica, mas sim, espalhadas por todo território nacional. Fazendo essa pequena análise percebe-se que um quinto do território do Brasil não pertence aquele que cercou.
Em um artigo do professor Ariovaldo, outras informações são apresentadas no que tange ao cumprimento da função social ao se tratar de terras produtivas, demonstrando que apenas um terço da propriedade ocupada no Brasil cumpre a função social, conforme texto abaixo:
“Neste início de Século XXI, a situação continuava a mesma, pois, em 2003, havia no cadastro do INCRA, um total de 4 milhões e 563 mil imóveis ocupando 436 milhões e 596 mil hectares. Entre estes imóveis havia 111 mil grandes propriedades apropriando-se de 209 milhões de hectares (48% do total); 295 mil médias propriedades em 87 milhões de hectares (20%); e um milhão e 140 mil pequenas propriedades com apenas 74 milhões de hectares (17%). Havia ainda 275 mil imóveis não classificados e 2 milhões e 741 mil minifúndios, que merecem uma análise à parte em outra oportunidade.
(...) Com o aumento do número de imóveis e da área cadastrada em mais de 100 milhões de hectares em 2003, havia apenas 161 mil imóveis (grandes e médios) classificados como produtivos ocupando 120 milhões de hectares (27%) da área cadastrada. Enquanto isso, 245 mil grandes e médios imóveis improdutivos continuavam a se apropriar de 176 milhões de hectares. Entre estes imóveis improdutivos, 54 mil grandes propriedades concentram 120 milhões de hectares. Aliás, entre as grandes propriedades improdutivas duas mil delas concentravam um quarto desta área.”
Com a pequena síntese da narração do professor Ariovaldo, se compreende que a reforma agrária no país é mais que necessária, mesmo na atualidade, vez que, há uma grande parte das terras que na realidade são devolutas e deveriam ser destinados à demarcação de terras indígenas, pequenos posseiros, à reforma agrária e à preservação ambiental, todavia, estão em posse de grileiros e latifundiários que não realizam o aproveitamento necessário dessas terras e apenas faz aumentar o índice de desigualdade e a privatização de terras.
Ainda, outra conclusão que se chega é que apesar do INCRA realizar todas essas pesquisas, muito pouco é visto no caso concreto no que tange as desapropriações para fins de reforma agrária, demonstrando que mesmo com os dados em mãos há um grande entrave no que se refere à reforma agrária nesse país.